“As cruzes não perdoam...5 litros de água em cada braço já é demais para as minhas costas... Quando tinha vinte anos nada me metia medo, mas agora... já não sou o que era... tenho de me conformar... as vértebras já estão gastas, ou os discos, não sei, o médico diz que não posso fazer esforços, mas que só se opera em último caso... tenho de ir aguentando. A velhice traz tudo!”
As dores músculo-esqueléticas (dores nos músculos, ligamentos, tendões, ossos ou articulações) são das dores mais frequentes na população em geral. O Programa Nacional de Luta contra a Dor, de 2017, refere que as dores lombares, as dores osteoarticulares (vulgo, artroses) e as dores de cabeça são as dores de que mais se queixam as pessoas.
“Já não consigo fazer o que fazia dantes... Antigamente fazia tudo em casa, até subia ao escadote para limpar as janelas e tirar os cortinados... agora já não faço, tenho medo de não conseguir e cair... tenho menos força...”
As
dores músculo-esqueléticas são um problema por si só, mas também trazem outros
problemas consigo. A pessoa com dor torna-se menos ativa, mexe-se menos, e com
isso perde mobilidade e força muscular, deixando muitas vezes de fazer algumas
tarefas diárias que fazia antigamente.
“Esta dor cansa-me.… estou farta
disto... não me deixa dormir bem, nem consigo descansar... isto deixa-me em
baixo...no que a gente se torna, eu não era assim”
As
dores crónicas tem também muitas vezes efeitos a nível mental. As pessoas que
têm dor crónica tem tendência a sofrer de maior ansiedade, havendo também maior
tendência para depressão.
Quanto
mais tempo durar a dor, mais tendência há para estas consequências negativas da
dor se acumularem.
“A
velhice traz tudo... quando era nova não tinha dores nenhumas, fazia tudo,
agora já não... enfim, temos de aceitar, faz parte da velhice...”
Será que envelhecer traz necessariamente mais dores?
Alguns estudos também indicam que o
limiar de sensibilidade à dor parece alterar-se com a idade, o que significa
que os idosos tendem a sentir menos dor ligeira, mas parecem ficar
mais sensíveis à dor severa.
Contudo, sentir dor não faz parte diretamente da velhice, mas resulta sim de problemas de saúde mais frequentes na idade sénior, que precisam de ser tratados.
As doenças na idade sénior mais
associadas com a dor são a osteoporose (devido às fraturas), a osteoartrite (artrose),
a artrite reumatóide e a polimialgia reumática, afetando cerca de 80% da
população com mais de 70 anos. As zonas de dor mais afetadas são a lombar, as
ancas e os joelhos.
“Já não me bastam as dores, mas agora também me
apareceram diabetes, e a tensão alta... já fui ao médico e tenho de tomar
medicação para controlar isto...”
A dor nos adultos seniores parece andar de mão dada com outras doenças, como a depressão, problemas de coração, obesidade e diabetes. As mulheres idosas também têm tendência a relatar mais dor do que os homens.
Parece haver também uma associação
forte entre dor e estados depressivos. A solidão e o isolamento social parecem
estar associados a maiores níveis da dor, em adultos seniores.
Outro fator importante é a presença
de sarcopenia nas pessoas mais velhas. A sarcopenia é uma condição que se
caracteriza pela perca significativa de massa muscular.
Sabe-se que pessoas com perca significativa de massa muscular tem mais tendência
para ter dores crónicas, como é o caso de muitos adultos seniores. Isto leva a que os adultos fiquem menos
ativos e tenham também maior risco de cair.
Mas então as dores crónicas têm
solução?
“Eu vou ao médico e à fisioterapia e dizem-me que tenho de aguentar estas dores... já não tem cura e faz parte da velhice”
Muitas vezes as pessoas deixam de fazer perguntas sobre as suas dores porque lhes é dito e interiorizam que é parte natural da velhice, não há nada a fazer.
O
que sabemos é que a dor mal tratada leva a pior qualidade de vida, tanto física
como mentalmente, afetando toda a nossa vida.
As dores crónicas muitas vezes não têm
uma cura total, mas com o tratamento
adequado é possível diminuir muito a intensidade da dor, gerir muito melhor
a situação e melhorar a nossa qualidade de vida. Não é verdade que não haja nada a fazer.
A grande questão com o tratamento
das dores crónicas é que o tratamento deve ser individualizado e multimodal,
para ser efetivo. Ou seja, várias
estratégias de tratamento tem de ser usadas e combinadas, para um efeito
ótimo, sendo necessário perceber para
cada pessoa quais são as melhores estratégias para ela.
Os tratamentos mais importantes são:
–
atividade
física/exercício físico (ex. Pilates Clínico, treino de força)
–
modalidades e
terapias manuais
–
educação sobre
dor
–
medicação
–
suplementação em
algumas situações (nomeadamente vitamina D)
–
terapias
mente-corpo (meditação, exercícios de respiração)
–
terapias
psicológicas (terapia cognitivo-comportamental, etc)
“Já
experimentei tomar medicamentos, fazer Fisioterapia, caminhar, e nada resulta,
estou na mesma...”
Pois.
Para que o tratamento seja efetivo é preciso ter um programa estruturado de
tratamento, onde se avalia quais as intervenções mais benéficas para aquela
pessoa, de modo a que os vários tratamentos possam ser aplicados de forma concertada e simultânea, para se obter o
máximo benefício.
Se usarmos só uma estratégia de cada vez, isoladamente,
ou se escolhermos os tratamentos menos benéficos para nós, é muito provável que
não tenhamos nenhum resultado!
Se tem dores
crónicas procure o seu fisioterapeuta.
Explique a sua dor e peça ajuda.
Não aceite
sugestões de tratamentos isolados (um programa de Fisioterapia para dores
crónicas deve conter sempre vários tipos de tratamento como exercício físico, terapias
passivas, técnicas de relaxamento, etc),
não embarque
em tratamentos alternativos não comprovados (ex. endireitas, homeopatas, etc.),
não faça a
gestão da sua dor só com medicação.
Peça uma
avaliação completa da sua situação e um programa de tratamento que aborde as
várias componentes da sua dor.
Com o plano de tratamento certo a dor crónica
pode melhorar muito!
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